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Aprendizagem & Memorização





Um dos problemas que mais frequentemente encontramos é a dificuldade com que, por vezes, somos confrontados, na prática ritual. Não me refiro apenas aos erros que por vezes se cometem na leitura dos textos rituais, o que eu quero dizer é que muitas das vezes o ritual é monótono e pouco inspirado. No entanto, qualquer Companheiro pode praticar o ritual bem e de forma correcta, desde que saiba quais os passos a dar e a forma como agir, no sentido de melhorar a prática ritual. Não é difícil, na verdade, é sobretudo uma questão de saber como fazer, claro está, mas sobretudo de muita prática.

Este artigo destina-se a dar algumas orientações sobre como praticar bem o Ritual. Não exige muito tempo, nem nenhum talento especial, apenas uma disposição para fazer bem. No geral, com alguma prática, todos seremos capazes de usar algumas destas técnicas para uma boa prática ritual. Especificamente, é destinado, a lidar com os discursos mais longos, muito embora seja também relevante para os textos mais curtos.


1. As palavras

O primeiro passo para a aprendizagem de qualquer ritual é saber o que estamos a dizer! Pode parecer, à primeira vista, uma afirmação óbvia, mas a verdade é que muitas vezes é negligenciada. Alguns dos Companheiros têm medo de admitir que ainda não sabem as palavras certas. É preciso não ter medo de admitir os seus próprios limites. Primeiro passo, começar por ouvir o discurso, de preferência, várias vezes. Segundo passo, ouvir com atenção e certificar-mo-nos de que compreendemos o que está a ser dito. Em seguida, é preciso, ir ao Ritual Impresso, ver o que conseguimos dizer de cor. Marcar as palavras que não nos lembramos ou que não conseguimos descobrir ou em que estamos inseguros - é este o ponto de partida para descobrir todos os erros que podemos estar a fazer. Passo seguinte, falar com um irmão ligado à prática ritual e fazer com ele uma leitura atenta do ritual, corrigindo eventuais erros e esclarecendo, eventuais, palavras desconhecidas. Tomar notas para não esquecer as correcções feitas.


Compreender o Discurso

Ler o ritual várias vezes e verificar se estamos realmente a compreendê-lo. Não basta conhecer as palavras – é preciso saber o que estamos dizer. Encontrar fora do texto o que os personagens estão a falar. Novamente, é preciso colocar perguntas. Por esta altura, devemos começar a tentar compreender o discurso estruturalmente. Qualquer ritual é composto de componentes, peças separadas que estão ligadas entre si. Por exemplo, numa das secções do ritual do Grau de Mestre Real podemos estar a falar de símbolos, contudo estes símbolos podem ter um significado concreto, abstracto e um propósito. Descobrir que peças são estas que estão ligadas é importante – vamos usá-las mais tarde. O próximo passo é especialmente útil para discursos longos – a visualização do discurso. Qualquer fala pode ser pensada em termos de movimentos, lugares, salas, etc… As palavras, por ordem, são difíceis de lembrar, os locais são fáceis. O exemplo canónico é a Câmara do Meio. O caminho, visualizado, é fácil, e é um bom exemplo de como aprender o ritual, que é provavelmente o primeiro grande discurso oficial que se aprende. É por isso importante, em primeiro lugar, usar locais e símbolos, são fáceis de aprender e de interiorizar.


a) Memorização em Pequena Escala

Esta é uma parte que ninguém gosta, qualquer pessoa pode fazê-lo, mas todos acham muito complicado. No entanto, é consideravelmente mais fácil do que podemos pensar. Começamos por ler o discurso várias vezes. É importante, não passar à etapa seguinte até que possamos ler rapidamente todo o texto, sem pausas ou hesitações. Ler em voz alta, quando temos a oportunidade. Esta etapa é particularmente importante, mas é muitas vezes ignorada, mais do que qualquer outra. Os mecanismos mentais usados para falar são distintos daqueles usados para ler, importa por isso não passar por cima deste primeiro passo. Ler as primeiras palavras da frase, em seguida, tentar preencher o restante espaço da memória. Não nos devemos preocupar se não acontece imediatamente, por vezes, são precisas 5, 10 ou mais vezes até perceber o que realmente está a ser dito. 

Vamos encontrar algumas situações difíceis – malhetes e mais malhetes (mas mais uma vez, esta é uma etapa que não podemos negligenciar) – mas, antes da próxima etapa, importa chegar ao ponto em que já sabemos razoavelmente bem o discurso.


b) Memorização em Grande Escala

Assim que tivermos a maior parte das frases memorizadas, passamos aos parágrafos. Novamente, alguns serão mais fáceis que outros. Um ponto importante é que quase sempre um parágrafo tenta expressar um único pensamento, em pedaços; descobrir o que o pensamento é, e porque todas as peças são necessárias, é fundamental. Até que sejamos capazes de conseguir mais do apenas as primeiras palavras. Finalmente, começar a colocar tudo o que já sabemos em conjunto. Este é o lugar onde a análise estrutural da Etapa 2 é importante. A visualização do discurso, descobrir como ele está unido, utilizando a visualização para ligar os parágrafos. Verificar, neste ponto, se existe alguma pista em cada parágrafo que segue uma anterior. Cria-se assim um fluxo, que nos torna a memorização mais fácil e que nos permite identificar qual o parágrafo a seguir, sem nunca esquecer a ordem.


Suavização

Estamos agora no ponto onde já temos as frases e a maioria dos parágrafos memorizados e somos capazes de obter o texto todo olhando apenas para o livro algumas vezes. Algumas palavras acabam por ser mais difíceis de pronunciar do que o esperado. Experimentamos em voz alta. Começamos por tentar fazer isso com frequência - uma vez, duas vezes por dia. No princípio, vai ser difícil, mas progressivamente verificamos que será cada vez mais fácil. Quando estivermos confortáveis, é importante não parar. Praticar dois dias por semana, não diminuindo a velocidade, podemos mesmo até aumentar a velocidade e acelerar a recitação.


Mindset

Última parte. Estamos agora no ponto em que temos o ritual memorizado. O truque, agora, é aprender a executá-lo bem. Quase todas as pessoas tem algum medo de palco, no entanto, o truque para superar o medo é o controle dos nervos. Observamos agora o modo como dizemos o ritual, até agora, não pensámos muito no que estávamos a dizer, a boca fazia a maior parte do trabalho e a mente, simplesmente, fazia algumas ligações entre os parágrafos. Agora, antes de começar a executar tudo aquilo que está memorizado, concentrar-mo-nos, respiramos profundamente algumas vezes, ficamos calmos. Se estivermos calmos, é improvável que alguma coisa corra mal, ao contrário, se estivermos tensos, podem acontecer erros com mais frequência. 

Algumas pessoas gostam de exercitar um pouco o corpo para relaxar a mente, cada um deve fazer o que funcionar para ele. 


Cinema

Agora, a nuance final, que separa um ritual executado de forma competente, de um fraco e sem força. Agora que somos capazes de deixar a boca falar, começamos a ouvir-nos a nós mesmos. Pensamos de novo o ritual, mas não sobre as palavras, sobre o que significa. Quais são os bits importantes? Como podemos utilizar o corpo ou as mãos para ilustrar um ponto? Tentar conversar com alguém - olhá-lo nos olhos e fazê-lo chegar ao ponto. Tentando capturar um pouco da intensidade emocional da leitura. Pensamos no desempenho como uma fusão de duas partes. A boca fornece as palavras, a mente e o coração, a emoção. Lembre-mo-nos que é apenas um ensaio. Não nos preocupemos, se sentirmos a necessidade de mudar alguma coisa - ter que pensar sobre as palavras brevemente, quando alteramos parágrafos ou algumas palavras, pode tornar-se difícil, mas desde que se mantenha a completa noção do que estamos a dizer, descobrimos qual a peça que leva ao próximo parágrafo, evitando que cada vez que tropeçarmos, possamos cair.


Conclusão

Não podemos esperar que sejamos capazes de conseguir tudo isto imediatamente, a maioria das pessoas levam anos para uma correcta memorização e prática ritual correctas. Mas pouco a pouco, devemos tentar avançar. Aprender as frases, os parágrafos, praticar o ritual e melhorar dia a dia até àquele tempo em que começarmos a praticar o tipo de ritual que a Maçonaria pretende ter – quer a nível da prática propriamente dita, mas também da aprendizagem e do seu significado real.


"A Maçonaria Universal ..."
Magazine, edição 26
Mark Waks

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